Place des Vosges

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sexta-feira, 12 de junho de 2015

Meu amigo de Nara

Viajar pra mim é um presente da vida. Em todas as vezes que viajei eu agradeci MUITO pela oportunidade e em cada vez que estive fora de casa tive a felicidade de viver situações que fizeram valer cada centavo, cada minuto e cada distância percorrida. Eu sou ótima quando o assunto é lembranças, mas sou péssima no questio manter contato. Por essas e outras acabo conhecendo pessoas queridas, mas que com o passar do tempo perco o contato. Porém, como disse, as lembranças vivem fortes dentro de mim.
Meu amigo de Nara não é um desses casos. Eu não sei o nome dele, não falamos a mesma língua e sequer temos uma língua em comum. Ele só fala japonês, mas me permitiu uma experiência tão feliz de viagem que merece mais um post dedicado a ele.
Mais um post? Sim... ele já esteve por aqui. Olha só meu amigo de Nara.
Quem não esteve por esse blog na época, vamos a um resumo: viagem ao Japão, campeonato mundial, jogo do Corinthians, tal e coisa, coisa e tal, fomos almoçar em um restaurante muito simpático em um lugar bem escondido de Nara. Como fomos parar lá? Bem... andando, vira aqui, dobra a outra esquina, fecha os olhos e tcham: que lugar fofo, vamos lá. Na brincadeira do mundial e tudo mais, rolou o vídeo do link aí em cima. Comida excelente, pagamos a conta e as lembranças do cara bacana que topou fazer o vídeo. Fim.
Não... não acabou por aí.
Um ano e meio depois, lá volto eu para o Japão, também para Nara e eu me lembrei: "Poxa, tem o restaurante do cara do vídeo". Só que onde era? Qual o nome? Graças à tecnologia meu irmão me mandou um Whatsapp com uma foto do flyer do restaurante - tudo em japonês. Corri para o escritório de informações turísticas atrás de informações. O moço que me ajudou deu uma localização aproximada. Passeios, fotos, alegria, hora do almoço.
De certa forma eu lembrava mais ou menos a região do restaurante, mas não tinha a menor ideia do local exato. Andamos, andamos, andamos e nada. Bom... vai que o restaurante fechou, né? Caminhamos, caminhamos, caminhamos... nada. Não tardou para que algo me parecesse familiar. Na verdade tudo parece familiar naquele bairro, é tudo muito parecido, ruas pequenas, casas no mesmo estilo... mas algo me mandou entrar em uma rua. Lá estava o restaurante!
Restaurante fofo, sim, muito fofo e nesse um ano e meio ele deu um jeito de caprichar ainda mais. Abri a porta, Chico Buarque cantava e eu fiquei sem entender muita coisa. Na época do mundial o moço era sozinho... bem, só tinha ele para nos atender. Nessa segunda visita, uma mulher abriu a porta. "Hummm... nova proprietária", pensei, mas sentamos assim mesmo para o almoço.
Enquanto nos acomodávamos chegaram as tradicionais toalhas quentes para as mãos, trazidas pela simpática moça. Pedimos uma cerveja, conversávamos e eis que aparece o meu amigo de Nara!
Eu não sou nenhuma expert em ética e comportamento no Japão, aliás, sou praticamente leiga no assunto, mas levei comigo um print da nossa foto do mundial no meu celular. Ele veio nos atender com a tradicional calma oriental, pegou nossos pedidos e eu não resisti. Talvez tenha quebrado todas as regras da cultura local, mas não pude evitar em chamá-lo e mostrar a foto no celular. Silêncio. Silêncio. Silêncio. Ele encarou a foto, me encarou, foto, eu, eu, foto e pela primeira vez ouvi uma palavra dele que eu pudesse compreender: "Oh, I remember" e em choque se retirou.
Putz, e agora? Almoçávamos e discutíamos o quão absurda foi minha invasão na vida do moço, tentávamos somar todas as regras de convivência que eu quebrei, qualquer trauma que podia ter gerado, porque desde o episódio da foto ele sumiu e não apareceu nunca mais. Ainda tentei enrolar na comilança, pedaços pequenos... vai que ele volta? Mas nada dele retornar...
Não tínhamos como enrolar mais, até porque o restaurante é pequeno, três mesas, nada mais, e isso faz com que sejamos o centro das atrações. Pedi a conta e fiquei bem chateada de ter causado tal trauma, quebrado tanto as regras em um país e cultura que eu admiro tanto. A conta chegou, pagamos e pedi para ela trazer, junto com o troco, o nome do restaurante. Ela voltou e não me trouxe o nome, me trouxe um postal.
Um postal escrito em inglês! Um postal de Nara escrito em inglês pelo meu amigo de Nara! E em japonês também, no rodapé ele colocou o mesmo texto em japonês. Eu quase chorei.


Com os olhos marejados levantei para agradecer e eis que aparece o meu amigo de Nara com uma máquina fotográfica na mão! Ele queria uma foto: eu, ele e ela! Passada a sessão de fotos eu comecei a agradecer e elogiar em inglês, mesmo ciente de que ele não estava entendendo nada do que eu dizia. Ele também falava sem parar em japonês, sei lá o que dizia, mas terminou o discurso com um "Thank you, thank you very much" tão sincero que me fez querer parar o mundo e agradecer a Deus pela minha existência nessa vida só por ter vivido esse momento.



Fomos embora, ainda não sei o nome dele, não sei o endereço em um alfabeto que eu possa compreender, mas soube mais uma vez que a vida é feita desses pequenos momentos. Eu sou muito feliz por ter tido essa experiência. Ah, sim, também descobri o nome do restaurante: Poku-poku e é pra lá que eu voltarei se tiver mais uma chance de ir ao Japão. E outra, outra e mais outra.
Obrigada por tudo amigo de Nara! Até a próxima - se Deus quiser!


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